A calçada portuguesa é uma das imagens mais reconhecidas de Lisboa, mas o seu percurso esconde curiosidades e episódios pouco conhecidos. A Entidade Regional de Turismo da Região de Lisboa (ERT-RL) reuniu algumas dessas histórias, sublinhando a importância de preservar esta tradição, agora candidata a Património Cultural Imaterial da Humanidade pela UNESCO.
O primeiro registo da calçada remonta a 1821, no Terreiro do Paço, quando os caminhos de terra e pedra irregular foram substituídos por mosaicos de calcário. O objetivo era conferir uma imagem mais moderna à cidade, mas rapidamente os pavimentos deixaram de ser apenas funcionais para se tornarem expressão artística coletiva.
O momento fundador deu-se em 1842, no Castelo de São Jorge, então utilizado como prisão. Sob orientação militar, alguns reclusos criaram no chão uma figura inesperada: um rinoceronte feito com pedras pretas e brancas, em referência ao animal oferecido a D. Manuel I no século XVI. O impacto foi tal que o modelo se espalhou por Lisboa, dando origem a padrões e composições que ainda hoje caracterizam a cidade.
Com o tempo, os calceteiros passaram também a deixar marcas pessoais discretas nos pavimentos – pequenas figuras de peixes, estrelas ou iniciais gravadas em pedra – transformando cada obra num testemunho individual e coletivo.
A calçada portuguesa não se limitou a Lisboa. O estilo espalhou-se por outras cidades e mantém-se presente em Macau, Rio de Janeiro, Buenos Aires e Luanda, onde ainda existem padrões lisboetas intactos, funcionando como extensão da cultura portuguesa além-fronteiras.
Em março deste ano, a calçada foi oficialmente candidata a Património Cultural Imaterial da Humanidade pela UNESCO. A candidatura contou com a participação de mais de 50 calceteiros, municípios e instituições, com o objetivo de valorizar os mestres que preservam a técnica e garantir que o saber não se perde.
Entre os que continuam a praticar e a divulgar esta arte está Vítor Graça, formado na Escola Municipal de Calceteiros de Lisboa, que já levou mosaicos portugueses a cidades como Budapeste, reforçando a dimensão internacional da tradição.
Hoje, a calçada portuguesa é reconhecida não apenas pelo seu valor estético, mas como um património coletivo que combina história, identidade e transmissão cultural. Ao caminhar por Lisboa, cada pedra guarda um pedaço da memória da cidade.